16x23cm • 288 páginas • brochura

 

“Este livro traz o debate em torno do legado das mulheres e se endereça para todas as pessoas interessadas em perceber como os sotaques e a atmosfera territorial de quem filosofa agrega algo indispensável na arte de pensar.”

Renato Noguera, professor de Filosofia do Departamento de Educação e Sociedade e do programa de pós-graduação em Filosofia da UFRRJ, pesquisador e doutor em Ensino de Filosofia, História e Cultura Afro-Brasileira, Africana e Indígena e autor de Por que amamos e Mulheres e deusas.

 

A filosofia sempre teve o rosto de um homem velho e reflexivo, com uma barba longa e uma túnica grega…

Mas essa figura acaba excluindo a imagem (e, por consequência, o trabalho) de outros filósofos dentro do nosso imaginário.

Onde estão as filósofas mulheres?

Mesmo com poucas informações disponíveis nos registros, o livro busca em todos os capítulos citar e contar a história de pelo menos uma filósofa de fora da Europa (Ásia, América Latina e África).

Novidade na 2ª edição

Atendendo a pedidos de vários leitores e seguidores das duas autoras, elas incluíram na 2ª edição, de 2024, a contribuição das filósofas indígenas. O novo conteúdo está na seção Malalas e Ninas: Pensadoras e filósofas hoje.

 

NATASHA HENNEMANN

É natural de São José dos Campos, interior de São Paulo. É uma apaixonada professora de História e Filosofia. Graduada pela Universidade de São Paulo e especialista em ensino de História, vive seus dias cercada pela família, amigos, colegas e alunos. Gosta de tirar cochilos, dançar tango, estudar e ler; participa de clubes de leitura e recomenda livros no canal Redemunhando no Youtube. Pode ser encontrada no perfil @redemunhando do Instagram.

FABIANA LESSA

É de Duque de Caxias (RJ). Graduada em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e mestranda em Filosofia e Ensino pelo CEFET/RJ, é professora na educação básica na região metropolitana do Rio de Janeiro, pois a educação sempre fez parte de sua vida, graças às professoras da família. Café, livrarias e andar de bicicleta na praia estão entre suas coisas favoritas. No Instagram @fabianalessaprof, compartilha o cotidiano de uma professora de Filosofia.

O que esperar desse livro

  • Antiguidade (4000 a.C. – 476 d.C.)

    Capítulo I – Helenas: Mulheres na Filosofia Antiga

    Antiguidade (4000 a.C. – 476 d.C.)

    Introdução à filosofia: como surgiu, por que a Grécia é considerada berço da filosofia (apesar de existirem indícios que seja o Egito) e qual a sua importância no estudo da filosofia.

  • Capítulo II – Evas e Marias: Mulheres na Filosofia Medieval

    Idade Média (476 d.C. – 1453)

    A enorme influência religiosa (cristã e muçulmana) na filosofia e introdução de como ela se desenvolveu na região do Oriente Médio e Ásia e qual o papel da mulher filósofa nela.

  • Capítulo III – Sibyllas e Dandaras: Cientistas e revolucionárias na Filosofia Moderna

    Idade Moderna (1453 – 1789)

    Filósofas que se dedicaram a pensar principalmente sobre a condição feminina na sociedade, na reivindicação de direitos e no desenvolvimento científico.

  • Capítulo IV – Berthas e Fridas: Pensadoras da vida e da sociedade (ética e política)

    Idade Contemporânea (1789 – atual)

    O que une as filósofas aqui abordadas são os temas ética e política, muito importantes para a filosofia e que se interligam. Elas nos convidam a pensar sobre o que são atitudes éticas, como nos determinamos a partir dos valores pessoais e sociais e como os sistemas de governo e política exercem força sobre os indivíduos.

  • Capítulo V – Carolinas e Emmas: Gênero, raça, classe e decolonialidade

    Idade Contemporânea (1789 – atual)

    Aqui, as filósofas nos trazem uma perspectiva filosófica muito forte a partir do século XX no ocidente, sobretudo impulsionadas pelos movimentos sociais como as ondas do feminismo, o movimento antirracista e os movimentos de trabalhadores e classes operárias. Mulheres que refletiram profundamente sobre questões de gênero, raça, classe e decolonialidade.

  • Capítulo VI – Malalas e Ninas: Pensadoras e filósofas hoje

    Idade Contemporânea (1789 – atual)

    Ao contrário do que é comum pensar, a filosofia não é um tema do passado, ainda hoje há muitas filósofas que continuam debatendo o mundo. O último capítulo procura dar um tom de continuidade na filosofia através das filósofas mulheres que estão produzindo no presente.

PREFÁCIO

O que essas mulheres e tantas outras filósofas nos convidam a pensar?

A filósofa Djamila Ribeiro deu publicidade significativa à expressão conceitual “lugar de fala”, uma categoria analítica tanto na linguística quanto na área de humanidades. Lugar de fala engloba fatores de gênero, étnico-racial, social, histórico, geracional, territorial, entre outros. Ora, o lugar de fala não impede que alguém trate de um assunto. Pelo contrário, o seu reconhecimento contribui para que o diálogo seja ainda mais potente. Não é preciso neutralidade ou uma espécie de imparcialidade. Afinal, os discursos que se declaram neutros e imparciais escondem algo. Portanto, ninguém precisa pedir autorização para discorrer sobre um assunto – desde que reconheça o seu lugar de fala. Por exemplo, gente branca pode e deve falar de relações étnico-raciais, assim como homens não podem se esquivar de debater sobre gênero (nem que seja para declarar que se trata de uma performance). É importante frisar que o fazer filosófico não parte de um sujeito neutro. O pensamento filosófico é, antes de tudo, um posicionamento, isto é, o estabelecimento de um lugar (ou ainda, muitos lugares) no mundo.

O livro Filósofas: o legado das mulheres na história do pensamento mundial começa problematizando o berço grego da filosofia. Em uma área onde não achamos lugar para respostas consensuais, durante um longo período o mainstream filosófico esteve blindado e defendeu sem autocrítica que a filosofia era uma “invenção grega”. Do mesmo modo, durante milênios, na expressão “o Homem”, “lia-se” que o termo “homem” era sinônimo de seres humanos. A obra cobre uma lacuna a respeito de personagens da história da filosofia que são pouco conhecidas. Nos manuais escolares não é frequente lermos os nomes destas filósofas: Diotima de Mantineia, Aspásia de Mileto, Axioteia de Filos, Lastênia de Mantineia, Hipárquia de Maroneia, Pórcia Catão, Hipátia de Alexandria, Ban Zhao, Heloísa de Argenteuil, Hildegarda de Bingen, Shams de Marchena, Fátima de Córdoba, Rábia de Baçorá, Lubna de Córdoba, Lal Ded, Christine de Pizan, Mary Wollstonecraft, Charlotte Perkins Gillman, Harriet Taylor Mill, Hannah Arendt, Graciela Hierro, Philippa Foot, Lélia Gonzalez, Sophie Oluwole, bell hooks, Judith Butler, Angela Davis.

O que essas mulheres e tantas outras filósofas nos convidam a pensar? O que podemos pensar a partir delas? E, sobretudo, o que podemos pensar lado a lado com elas? Ou ainda, existe algo que as filósofas são capazes de dizer que os filósofos não têm como enunciar? Não cabe aqui exatamente encontrar um elemento comum em filosofias tão diversas, tampouco sugerir que o gênero impõe uma espécie de gradil específico para pensar. Mas, ao mesmo tempo, não podemos nos esquivar de compreender como patriarcado, machismo, sexismo, misoginia e o masculinismo interferem na circulação das vozes das mulheres. Só não podemos deixar de notar que na filosofia, assim como em outras áreas, existe um sistema estrutural de desvalorização feminina e a popularidade dos filósofos é significativamente maior do que das filósofas. Não podemos deixar de identificar como os mecanismos do privilégio masculino impuseram o silenciamento das vozes das mulheres na filosofia. Nessas circunstâncias, o que essas filósofas tem a nos dizer?

Pois bem, elas ressaltam uma peculiaridade nem sempre observada do fazer filosófico. A filosofia não é universal, ela vai além da universalidade. O fazer filosófico é pluriversal! Na história da filosofia, filósofas não abrem mão de redesenhar o mapa mundi do pensamento, porque o papel da filosofia é justamente sugerir novos desenhos, contornos pouco frequentados, para enfrentarmos tanto as questões mais densas quanto os problemas mais movediços. A filosofia nos lança a um certo mistério cheio de encantos. As autoras ressaltam os elementos mais decisivos no pensamento de cada filósofa. Essa é uma das maiores virtudes de fazer filosofia: conversar com modos de pensar, reconhecer as suas fronteiras e a sua potência em deslocar o nosso pensamento. As autoras Natasha Hennemann e Fabiana Lessa traçam trilhas preciosas para um percurso em que as arquiteturas conceituais são marcadas por uma espécie de “novo brutalismo”. Na arquitetura, o novo brutalismo é reconhecido como, ao mesmo tempo, slogan e rótulo. O “Brutalismo” é um estilo arquitetônico em que elementos como ferragens e tijolos ficam expostos. De modo paradoxal, a coragem das autoras em elaborar um desfile de filósofas em um ritmo aparente de novo brutalismo escapa aos signos do slogan e do rótulo. Ora, o paradoxo é uma instância que nos ajuda a pensar filosoficamente. O gênero como categoria analítica tem sido problematizado por diversas pensadoras, ressignificando a noção que lhe atribuía uma espécie de natureza ontológica. Hennemann e Lessa expõem um ponto cego da história do pensamento filosófico mundial sem propor um texto no gênero manifesto.

Existem algumas armadilhas que um livro intitulado Filósofas: o legado das mulheres na história do pensamento mundial suscita em leituras apressadas. Não há tempo para discorrer sobre cada uma delas, mas, podemos insistir em não sucumbir às arapucas das camisas de força da identidade de gênero. Não se trata de encontrar uma natureza própria das mulheres, nem recusar que há papel político da categoria gênero, tampouco de negar como as estruturas de opressão e domínio sobre elas interferem nos circuitos da intelectualidade. Patriarcado, sexismo, machismo, misoginia e masculinismo dificultam que o circuito de produção e difusão do pensamento filosófico registre mulheres com a mesma confiança que os homens. Eu recordo que em maio de 2022, durante um evento literário no Rio de Janeiro, a escritora nigeriana Chimamanda Adichie disse que mulheres leem textos de mulheres e de homens; mas, os homens leem, em sua maioria, autores.

O livro Filósofas: o legado das mulheres na história do pensamento mundial de Natasha Hennemann e Fabiana Lessa é um exercício intelectual enfático! É um convite para amplificar o repertório sobre o pensamento filosófico mundial, lançando luzes sobre pensadoras que muitas vezes não possuem o devido reconhecimento. Na atmosfera de circunstâncias adversas impostas pelo patriarcado estrutural, muitas pensadoras teceram enunciados filosoficamente insubmissos, o desassossego intelectual que nos incita a buscar contornos inéditos para antigas questões e combinação de velhos elementos para novos problemas. Um livro relevante tanto para quem está começando a tirar passaporte para viajar pelos itinerários filosóficos quanto para as pessoas que já desfilam há muitos carnavais pelos mundos possíveis da filosofia.

Pois bem, este livro traz o debate em torno do legado das mulheres e se endereça para todas as pessoas interessadas em perceber como os sotaques e a atmosfera territorial de quem filosofa agrega algo indispensável na arte de pensar. Existe algo em comum em todas as filósofas citadas neste livro, algo que é bastante característico das filosofias. A medida justa do pensamento está na sua potência de nos fazer pensar por caminhos inesperados.

Renato Noguera

Professor de Filosofia do Departamento de Educação e Sociedade e do programa de pós-graduação em Filosofia da UFRRJ, pesquisador e doutor em Ensino de Filosofia, História e Cultura Afro-Brasileira, Africana e Indígena e autor de Por que amamos e Mulheres e deusas.